No começo do mundo, uma ave de plumas brancas iniciou, partindo do centro do universo, uma jornada em busca de um paraíso para pousar. Depois de dias e noites voando, escolheu o litoral de uma terra imensa, onde caiu morta de cansaço. Suas asas transformaram-se em praias e, no lugar onde seu coração tocou o solo, abriu-se uma enorme depressão, invadida pelas águas. De seu sangue, formaram-se as 56 ilhas da maior e mais bela reentrância do país, a Baía de Todos os Santos, ou Kirymuré-Paraguaçu, segundo os primeiros habitantes da ilha de Itaparica, os índios tupinambás --essa história foi resgatada por um grupo de professores de escolas públicas da ilha de Itaparica.O próprio nome Itaparica vem do tupi. Significa "cerca de pedras", uma referência aos arrecifes de corais que bordejam a ilha e reduzem a força das ondas, o que explica porque suas praias têm águas rasas, mansas e mornas. Calmaria que faz desse pedaçinho de terra de 246 km2 bem preservado de mata atlântica, restingas e manguezais, um lugar bucólico, ideal para quem não quer fazer nada. É um verdadeiro convite ao ócio. A apenas 13 km de Salvador --menos de uma hora de travessia de lancha ou ferry boat -, a ilha de Itaparica é dividida em dois municípios: Itaparica, onde fica a antiga sede, e Vera Cruz, que emancipou-se em 1962 levando consigo a maior fatia-- exatos 211 km2, ou 87% do território.
O turista, que nada tem a ver com essa disputa, poderá desfrutar do que existe de melhor nos dois lados da "fronteira", mas irá notar com certo estranhamento que o nome Vera Cruz só existe nas placas de obras da prefeitura. Na boca do povo, o que vale é Mar Grande, localidade onde funciona a sede daquele município e espécie de centro nervoso da única estância hidromineral à beira-mar do país. Em Mar Grande é possível encontrar quase tudo o que existe numa grande cidade: lojas, supermercados, drogarias, restaurantes e uma gama de serviços que nem sempre estão disponíveis nas demais localidades da ilha. Enquanto a preguiça dá o tom na vizinhança, Mar Grande dorme tarde e acorda cedo: às 6h de um domingo já é possível circular pela praça central repleta de gente que aguardam uma das escunas que levam nativos e turistas para os passeios a outras ilhas da Baía de Todos os Santos, como Ilha de Maré e Ilha dos Frades. Ali mesmo na praça é possível fazer o desjejum com um bom mingau de tapioca, acompanhado de um pedaço de bolo de Carimã e cafezinho na tenda da Marizete.Quem quiser agitação deve atravessar a Baía de volta a Salvador. Na ilha de Itaparica os dias passam lentos, mas esta pasmaceira, que tanto irrita os habitantes dos grandes centros, orna perfeitamente com o astral da terra do escritor João Ubaldo Ribeiro. Embora haja transporte de vans para as principais localidades da ilha partindo de Mar Grande e de Itaparica, a melhor forma de conhecer o local é atravessando a Baía de Todos os Santos de carro, pelo ferry boat. Para evitar transtornos nas longas filas de espera que se formam no terminal marítimo de São Joaquim, em Salvador, o ideal é que o visitante faça a sua reserva com horário marcado com no mínimo duas semanas de antecedência. História da ilha Descoberta por Américo Vespúcio em 1501, Itaparica foi colonizada em 1560 pelos jesuítas, mas em 1510 já havia registrado a passagem do navegador português Diogo Álvaro Correia, o "Caramuru", que, ao casar-se com a princesa tupinambá "Paraguaçu", filha do cacique Taparica, formou a primeira família genuinamente brasileira.A posição estratégica e as belezas naturais transformaram a ilha em alvo de ataques dos corsários ingleses, ainda no século 16, e de invasões de holandeses, que chegaram a ali para se fixar entre os anos de 1600 e 1647, quando foram definitivamente expulsos pelos portugueses. Deste episódio foi erguido um dos mais belos monumentos de Itaparica, o Forte de São Lourenço, construído sobre as ruínas da fortaleza deixada pelos holandeses. É ali que funciona até hoje a única área de desmagnetização de navios do país.Bem próximo ao forte está o Solar do Rei, casarão construído em 1606 e que funcionou como sede da Casa do Contrato das Baleias. O Solar hospedou os imperadores D. João VI, D. Pedro I e D. Pedro II.
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